29.10.03

FAHRENHEIT 451

E se cada um de nós fosse um livro?
Se cada um de nós tivesse que decorar um livro para o preservar, para que não se perdesse?

Que livro escolheria?

PALHAÇADA

E a palhaçada continua.

Aquilo que hoje é visto como o triunfo da liberdade deixará de ter piada quando puser em liberdade o traficante, o assassino, ou o tipo da criminalidade organizada.
Vejam-se as artimanhas apalhaçadas usadas para evitar o começo de um julgamento (sim, do Bóbó, perdão, do Bibi). Agora, suponham que, face ao excesso de trabalho, ao volume de serviço, que existe nos tribunais, o período máximo de prisão preventiva estava a chegar ao fim.

Querem encurtar a duração da prisão preventiva? Preparem-se para, com recurso a estes estratagemas, os arguidos fazerem estoirar a prisão preventiva e serem postos em liberdade, para fugir ou continuar a sua senda criminosa.
Depois queixem-se. Depois olhem para as dificuldades do dia a dia de quem tem a seu cargo milhares de processos para investigação, para julgamento e deitem as mãos à cabeça.

Depois lembrem-se das vítimas.

MAs que sei eu disto?

28.10.03

A CULPA É DO TINTIM

A culpa do estado a que chegámos nos meios de comunicação social é do Tintim.
Muito se fala da falta de qualidade dos muitos "jornalistas" que povoam jornais, rádios e televisões. É natural que assim seja.

Pela sua idade, a maioria dos jornalistas, na sua infância e juventude, leu o Tintim. Leu, interiorizou, mas não se apercebeu disso. Por mim falo que, não sendo jornalista, só agora que releio as suas aventuras me apercebo do exemplo de jornalista que o tipo da poupa deu a gerações de leitores.

Tintim é jornalista. Assim o apresentam.
Tintim não trabalha. Que me lembre, nunca o vemos escrever uma peça que seja, apesar de muitas vezes aparecer como representante da imprensa (decerto pôs cunha).
Tintim não relata as notícias. Tintim faz as notícias. Intervém, molda os factos e tem sempre razão. Nada é sagrado, viola a privacidade das pessoas e impõe-se com arrogância.
Tintim é violento, e usa a violência para atingir os seus fins, nem sempre claros.

Tintim tem amigos estranhos. O Capitão Hadock não maruja, e vive numa mansão gigantesca. Com os sinais exteriores de riqueza que apresenta, hoje o Capitão seria suspeito de tráfico.
Nem vale a pena falar da cunha junto das autoridades, tolas, que são os mega-polícias Dupont e Dupond que intervém em qualquer país, qual política fascista dos EUA. Ou do Professor Girassol...

Em suma, os jornalistas de hoje interiorizaram Tintim como modelo e nem se aperceberam disso. Então, não fazem jornalismo. Intervêm, bisbilhoteiros, e criam os factos que depois expõem ao público.

A culpa é do Tintim.
MAs que sei eu disto?

27.10.03

TERRA DE CÃO

Vi o "Dogvile".
Se são adeptos de cinema que faça pensar, que desperte emoções e reinvente a forma de contar histórias no ecrã, ... não percam.
Se o último filme que viram foi "Os Anjos de Charlie - 2" ou o "American Pie - O Casamento", esqueçam.

MAs que sei eu disto?

SÓ ACONTECE COM OS OUTROS

Normalmente, só acontece com os outros. Nós somos bons e não fazemos asneiras dessas. Eu ainda o posso dizer (felizmente), mas nem por isso me livro das asneiras dos outros.
Seguia na A5 no sentido Lisboa - Cascais. Chovia, passava da 21h 40m, e antes da saída para o Estádio Nacional vejo carros embatidos, piscas acesos, carros a abrandar. Ia na via da esquerda, ligo os quatro piscas, abrando para parar, e olho pelo espelho, apercebendo-me que quem vem atrás já abranda também, há mais piscas acesos.
À esquerda, junto ao separador, segue um indivíduo a pé, com um triangulo de pré-sinalização de perigo, pelo que nele me concentro, quando estou quase a parar.
Subitamente, levo um pancadão por trás, vejo vidros a passar por cima do meu carro, assusto-me a pensar que o tipo que seguia a pé poderá ter sido atingido, e praguejo enquanto paro o carro adiante.
Aquele que me bateu terá sido tocado (?), bateu com a frente no separador central, entrou em pião e veio colidir de traseira na traseira do meu carro.
O carro é bom. Não sofremos nada, o Urso e a sua companhia, e a máquina ainda anda. O outro ficou feito em merda, imobilizado.
Perdi o resto da noite a preencher declarações amigáveis e participações na GNR-BT. Tenho o carro parado porque não tem luzes atrás do lado esquerdo.
Estou nas mão das seguradoras, à espera que me digam que posso ir pôr o carro a reparar.
Parece que estas coisas acontecem sempre aos outros. Este ano, já me partiram o outro carro, quando estava sossegado, estacionado na rua. Agora remodelam-me a traseira deste
Irra!

MAs que sei eu disto?

20.10.03

ADEUS RDA

Trabalho de nostalgia, reproduzindo um sonho ao mesmo tempo que demonstra a realidade.

O muro caiu, a RDA extinguiu-se, as diferenças culturais de 40 anos esbateram-se. Tudo sem dignidade, apenas com uma ânsia ocupacionista.

Em Adeus, Lenine o filho, para proteger a mãe da verdade que a pode matar, alimenta uma ficção segundo a qual é a abertura da RDA que promove a reunificação com a RFA. No fundo, e seguindo os bonitos princípios de um fictício novo dirigente, outrora cosmonauta, uma reunificação tal como deveria ter sido, e não como foi.

Caminhando entre a verdade e a mentira, entre a perda de referências e a absorção pela cultura de massas, entre o Estado castrador e o capitalismo empreendedor, mas sem humanidade, o filme leva-nos a um período recente da história da Europa que não deverá ser esquecido enquanto caminhamos rapidamente para uma União Europeia com muitas nações e uma voz. Ou talvez não.

À minha frente, um casal de alemães (sei lá se de leste ou de ocidente) ria nalgumas partes para mim sem piada. Os seus olhos viram o filme de forma diferente. Sentiram o filme de forma diferente.

São filmes como este essenciais para sabermos em que ponto estamos culturalmente nesta Europa.

Mas, que sei eu ainda?

15.10.03

PINHAL



Aqui sentado a ouvir Nick Cave enquanto lá fora chove com um cadência regular. Tudo está a ficar ensopado. A luz artificial já me dói nos olhos, dor essa que vai perfurando o crânio ameaçando romper na nuca. O tempo agarra-se às paredes e recusa-se a passar, obrigando-me a viver o presente.
Resta-me lembrar o passado, pois que o futuro nega-se a romper com esta vivência triste que levo, aqui fechado.
Felizmente deixam-me ficar por aqui, sem ter que me misturar com os outros, senão às horas certas da comida e do exercício. Não quero conviver. Não quero cruzar olhares com quem me conhece, reconhece ou pura e simplesmente se apercebe que estou aqui. O meu lugar não é aqui.
Tudo fora planeado para nunca acabar aqui.
Era tudo ou nada, mas mesmo Nada. O Grande Nada.
Nada.
Lembrei-me agora que, quando tinha os meus dezoito anos conheci uma Nada. Quase dez anos mais velha seduziu-me, usou-me e partiu-me o coração. Hoje nada me parte o coração remendado, porque o isolei com convicção. Como me isolaram entre estas quatro paredes, estas janelas gradadas, estes tipos que por aqui andam .
Não digo que esteja aqui mal. Quem mata outrem deve ser preso. Mas, caramba, quinze anos de tormento deveriam justificar o acto, e não impôr outros quinze anos, agora de reclusão.
E se voltasse atrás, certamente voltaria a usar a almofada. Teria era o cuidado de melhor apagar os vestígios.
Aprendi muita coisa no julgamento quanto à investigação. Coisas que não sonhava possíveis.
Tramei-me. Mas não tenho que ouvir mais aquela voz de rapina a picar sobre os meus ouvidos. Nunca mais sentirei o fel daquela boca amargurada que dia a dia me corroia a existência.
Chove lá fora.
Gostava de estar a fazer uma caminhada num pinhal qualquer.

13.10.03

A NOVA SEMANA

Depois do fim-de-semana que rapidamente voou, cá estou de volta a estas páginas.
Depois de Juan Manuel Fangio se perpetuar com aqueles cinco campeonatos do Mundo, que muitos pensavam imbatíveis, Michael Schumacher fez o hexa (ou bi-tri, como outros diriam). Vamos ter muitos anos para ouvir falar deste tipo, até que alguém bata este recorde.

Depois de muitos quererem politizar a Justiça, mesmo dizendo que querem ficar à margem (não atires pedras, que se podem transformar em boomerangs), continuamos a ouvir os meios de comunicação (desinformação) social a perder largos minutos e inúmeras páginas a falar do que eles acham que está nos processos que não conhecem mas que ouviram dizer, e que o especialista acha e que nós sabemos de fonte segura, ou melhor, fonte próxima. Como diria o da bola "mas o qué qué isto?, ó meu?"

Para ajudar, o juiz que tem seguranças para afastar os jornalistas, e deles se esconde e esquiva com recurso aos mais variados subterfúgios, decide falar em exclusivo para a SIC e uma pequena rádio. Depois admira-se se os outros não o largam.
Mas, o Juiz decidiu, está decidido.

A Selecção joga à bola, mas não joga futebol. Nem se corre com os velhos nem se investe nos novos, antes se muda, e muda, e muda, e muda. Disfarça-se a palhaçada com cinco golos marcados e procura-se tapar com a peneira os três (3!!) golos que a Albânia marcou em contra-ataque rápido, ao primeiro toque, e com convicção.
Adie-se o sonho, e fale-se na nova geração de ouro que aí vem. Esta geração de ouro mais parece pirite - o ouro dos loucos. Tantos anos e nem uma vitória que se veja.
Volta Humberto Coelho. Só tu soubeste lidar com estes tipos.

Não li livro nenhum esta semana. Nem o do Tintim, que comecei e fiquei a meio.
Não fui ao cinema.
Vegetei em frente à televisão, li os jornais (Público de 6ª, e DN de sábado) diários, que os semanários já chateiam.
Assumi algumas tarefas lá por casa que estavam à espera havia muito.
E, sem dar por isso, voltei ao gabinete e ao trabalho de mais uma semana.

MAs que sei eu disto?

10.10.03

BEM VINDOS ÀS MINHAS REFLEXÕES

Este Blog inicia uma nova era.

Vejo tanta coisa. Oiço tanta coisa. Leio tanta coisa.

Tanta asneira.
Tanta surpresa.

Mas, na solidão dos gelos sinto que não tenho, em tempo oportuno, com quem falar, com quem partilhar os meus pensamentos.

Ocasionalmente, quando apanho uma foca, ainda troco com ela umas palavritas antes de a comer. Mas, compreendam, não é uma ouvinte atenta, nem consegue responder com muita coerência. A proximidade da morte tem destas coisas.

Do breve comentário, à dissertação, passando pela piada, pela pergunta, pela ficção, de tudo um pouco disponibilizarei neste confessionário público, aberto a quem quiser perder tempo para o ler. Preparado para receber os comentários de quem quiser responder.

Com o tempo dirão se vale a pena perder tempo a ler o que escrevo. Se não lerem, tanto pior. A sabedoria de um Urso Polar acompanha a dimensão da planíce gelada.

Hoje tinha muita coisa por onde poderia começar a falar. Basta ler as primeiras páginas dos jornais para escolher temas apelativos. Nomeadamente, se alguns daqueles títulos são mesmos jornais, isto é, meios de comunicação social.

Mas guardo-me para a primeira indignação ou inspiração que aí venha. Desconfio que com o fim de semana à porta muito haverá que justifique umas palavras.

Não esperem, contudo, análises brilhantes. É que para isso temos o Marcelo, o Pacheco e o Tavares, sem dúvida os maiores egos, digo, crânios iluminados.

Esperem gelo e solidão. Pêlo e peixe cru. Força e patadas.

MAs que sei eu disto?