10.7.06

Pão e Circo

Embrutecidos por um mês de Futebol, com o desiderato financeiro alcançado graças a uma prestação da Selecção Nacional até ao jogo do 3º lugar, quase, quase até ao último dia, os meios de comunicação social despertam para a realidade.
Despertam?
Talvez não. O País está novamente a entrar no limbo estival, com temperaturas acima dos 40º, incêndios, pré-época, mercado de transferências, inquéritos de Verão, reposições televisivas...
Nos meios de comunicação social impera o espectáculo. A dor e o horror. O fútil, o entretenimento. É isso que o povo quer. É isso que se lhe dá. Pão e circo. Muito circo, e cada um que procure o seu pão.
Agora morreram seis bombeiros. A notícia ficou um pouco apagada por causa da cabeçada do Zidane e da entrega do caneco à Itália. A selecção Portuguesa regressou nesse mesmo dia e foi dar festa para o Estádio Nacional. O que interessa se morreram seis bombeiros. Que interessa que, não obstante as novas políticas, as novas estratégias, as novas linhas de comando e os novos meios aéreos a floresta continue a arder. O que importa é saber se Scolari fica mais dois anos ou não. E se o Nuno Gomes será o substituto de Pauleta, que arruma as botas junto do queijo flamengo, ou se vai continuar a jogar a nulidade do Postiga.
A semana passada ministros mudaram de gabinete. Freitas saíu e pouco se falou. Nas notícias o destaque era o futebol. E porquê? Porque era isso que a malta queria ouvir. Era disso que queria falar. Queria ouvir e ler os comentadores para no dia seguinte repetir o que na véspera uma sumidade qualquer dissera ou escrevera. Que se lixem os políticos, essa corja. Que se lixem os professores, os polícias, os Juízes, os médicos, os grevistas do Metro ou da Soflusa, os desempregados das fábricas que partem depois de terem gozado os benefícios com que as atraímos (triste jogo, pois que agora são outros a poder atraí-las). Importante mesmo é que fomos mais longe que o Brasil, que a Argentina, que a Inglaterra e a Holanda... que a Espanha, ah, ah, ah!
Olha para as montras e vê as promoções. Não tardam os saldos. Quem disse que estamos em crise, quando as lojas quase que nos oferecem a sua mercadoria? Paga € 0,20 por um pão feito à pressão ali no Pingo Doce e não te queixes. € 0,40 por uma garrafa de água e já é muito bom, porque se a comprares no café ou numa dessas máquinas automáticas pode sair-te a € 3,00 o litro! Duas vezes e meia um litro de gasolina, já viste? Então e não dizes nada? Ah, pois é, ficámos em quarto e o Ricardo defendeu três penaltis seguidos. Não consegues almoçar por menos de € 8,00 e o teu subsídio de almoço é inferior a € 3,40? Azar o teu. Leva umas bolachinas e bebe água... da torneira, que essa ainda é de graça. Então o Ronaldo sempre anda enrolado com a Merche Romero? Isso é que é uma mulher de futebolista... como a outra, a do João Pinto, aquela dos tomates que entrava no balneário dos homens.
Vai lá apanhar o teu sol, e encher as virilhas de areia. Vai enfiar-te nas filas de trânsito, absorver radiação para alimentar os ossos e esperemos que nada mais, que dentro em pouco acabam-se as férias que estão para começar, e já estarás a miar por causa dos preços dos livros escolares e da mochila e dos lápis (que o teu puto é muito fino para aproveitar o material do ano passado). E logo a seguire esperas pelo subsídio de Natal e num repente estarás a embrulhar prendinhas. Um dos grandes estará melhor que os outros e chega ao Natal à frente do campeonato, logo na altura em que se põem para aí a falar do aborto, essa coisa que só as mulheres depravadas e relaxadas querem. Aborto é o sacana do árbitro que nos roubou outra vez, dirás, cagando no referendo e depois culpando os Juízes que condenam as mulheres, os malandros.
E pelo meio vende-se papel, muito papel e pouco conteúdo. Enche-se a pantalha e lava-se o cérebro oco da populaça, sempre disposta a entrar em altos comboios, de preferência que não obriguem cada um a pensar. Isso dá trabalho. O melhor é seguir o que aquele gajo está a fazer.
O que é?
Não sei, mas estão aqui tantos... o melhor é ficar já por aqui.

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