16.1.08

A pedido do Miguel

Não vou abordar com muita profundidade o tema, porque as suas implicações são tantas que dava para escrever um tratado e este não é o sítio para tanto.
Quanto às novas circunscrições territoriais falta saber como serão as suas concretizações no terreno. Ou seja, e a título de exemplo a nova "comarca" Grande Lisboa - Sintra, que abrangerá os concelhos de Sintra, Amadora e Mafra (todos com pouca gente, pouca conflitualidade, pouco crime, pouca carência social e poucos problemas de menores, não é?), como serão colocados nos terrenos os respectivos Tribunais cíveis, criminais, de família e menores, do trabalho, com quantos juízos, com que estrutura de magistrados e funcionários, em que instalações. Porque, caso não haja um verdadeiro investimento no acréscimo destes meios, o buraco será cada vez maior e de mais dificil gestão.
Quanto ao Juiz-Presidente, várias das suas competências não são admissíveis. Começo pelas duas mais óbvias: a redistribuição de processos e deslocação de juízes.
Prevê a lei que possa o Juiz-Presidente redistribuir processos para assegurar a igualação e operacionalidade de serviços. Vejamos na prática: num Tribunal há dois juízos, cada um com um juiz. Um deles trabalha bastante, dedica-se demasiado ao trabalho porque lhe apetece, porque não tem mais nada para fazer da vida, isso não interessa; o outro produz significativamente menos, cumpre os mínimos exigíveis; ao fim de um tempo o segundo tem mais processos que o primeiro. Vai daí, o Juiz-Presidente manda redistribuir os processos para que o que trabalha mais vá fazer o trabalho do outro. Não só está aberta a porta para premiar a preguiça, e abusar da competência (que terá que fazer o seu trabalho e o do outro), como ao fazer a redistribuição se está a tirar a um juiz para dar a outro processos já distribuidos aleatoriamente, ou seja, assim violando o princípio do Juiz-Natural, aquele que nos assegura que a escolha do juiz que vai decidir determinado processo é aleatória não se podendo saber de antemão que alguém vai julgar um processo até que seja sorteado.
O segundo prende-se com a deslocação dentro da comarca de juízes para assegurar a distribuição racional e eficiente do serviço.
Um dos princípios de garantia de independência dos juízes é a sua inamovibilidade. A menos que haja razões disciplinares para o sancionar, nenhum juiz pode ser movido do seu cargo, para desta forma garantir que está imune a pressões aquando do julgamento. Permitir que alguém venha deslocá-lo dentro da comarca é violar tal garantia de independência, garantia esta criada, naturalmente, a favor de quem recorre à justiça. Estamos a falar de "comarcas" que, por exemplo, abrangem áreas como a do Oeste (que vai de Torres Vedras à Nazaré), do Baixo-Alentejo (de Barrancos a Ferreira do Alentejo) ou de Trás-os-Montes (de Alfandega da Fé a Vinhais).
A juntar a isto está a nomeação do Juiz Presidente, pelo CSM, onde os juízes estão em minoria e onde se pretende, com uma nova lei também já anunciada, retirar membros permanentes que são escolhidos entre os juízes nomeados para aquele Conselho substituindo-os por membros desse Conselho nomeados pelas forças políticas. Se isto não é uma tentativa de ingerência na independência do funcionamento dos Tribunais, não sei que mais é preciso fazer.
Já agora, esta lei da qual falei, mexe igualmente com a promoção aos tribunais de recurso (Relações e Supremo), passando a haver uma avaliação na qual os que decidem, sempre sob o "chapéu" do CSM, são cada vez menos os juízes e mais os nomeados pelo poder político. E que no Supremo passa a obrigar a uma quota de 1/5 de Conselheiros que não sejam juízes de carreira. Hoje, 1/5 dos Conselheiros podem não ser Juízes de carreira, e ser escolhidos de entre os juristas de mérito. Mas a verdade é que apenas lá estão dois e acham-se mal pagos e com demasiado trabalho.
Qual será o jurista de mérito a ocupar obrigatoriamente tal 1/5 das vagas, se os que têm verdadeiramente esse mérito ganham com um parecer o ordenado mensal de um Conselheiro? Está-se mesmo a ver, não é? Os "boys" do costume, prontos para decidir nos casos verdadeiramente importantes para a sociedade de acordo com critérios de fidelidade política ou pessoal. Ainda vamos ver Paulo Pedroso, ou o seu irmão como Juízes Conselheiros do STJ. Vai uma aposta?

1 comentário:

Anónimo disse...

Obrigado pelo teu ponto de vista... Possivelmente o melhor, até a presente data, pois estás em posição privilegiada para o fazer!
Um abraço
Miguel