6.10.08

Hipocrisias

A história vem em segunda mão, e o seu conteúdo nem é o relevante. A relevância fica-se pelas considerações que aqui decidi partilhar. Disse-me um amigo que numa ocasião social qualquer em que esteve, uma série de pessoas discutia com empenho e ansiedade a "onda de violência e criminalidade" que se vive. Porém, no fim do tal evento, discutiam igualmente qual a melhor maneira de chegar a casa sem encontrar polícia ou operações "stop", obviamente porque já tinham bebido demais e, ainda assim, iriam conduzir.
Não sou daqueles que acredita que hoje há muito mais criminalidade que no passado. Podemos ter vivido um pico, aliás, vulgar no calor do Verão, mas o que aconteceu foi um eco ensurdecedor nos meios de comunicação social que, à míngua de incêndios florestais, descobriu no crime fonte para fazer notícias. Ou seja, imitou aquilo que o Correio da Manhã sempre fez perante o desdém da concorrência.
Porém, aquilo que vejo é que quem mais se mostra perturbado com o crime são aquelas pessoas que estão sempre dispostas a colocar em causa a autoridade, nomeadamente de polícias e Tribunais. Tão depressa se queixam que os polícias não andam atrás dos criminosos, como vociferam contra os polícias por terem sido apanhados a conduzir embriagados.
No fundo, pessoas com dois pesos e duas medidas. Os outros são criminosos, porque sim. Eles, mesmo que conduzam com excesso de álcool no sangue, não deverão ser preocupação para as polícias porque eles não são criminosos. Ah, não?!
E tão depressa pretendem desautorizar um polícia como o querem forte e interventivo. Tão depressa exigem sentenças mais pesadas e prisão perventiva por "dá cá aquela palha" como depois fogem às notificações, escudam-se em subterfúgios e desobedecem às decisões judiciais que, por serem contra eles próprios, já são excessivas e injustas. Porque contra os "criminosos" tudo vale. Contra eles, nada será permitido, tudo é um abuso.
Um dos maiores problemas existentes em Portugal é a falta de autoridade que trespassa transversalmente toda a sociedade. As leis estão lá, mas toda a gente se acha no direito de as moldar aos seus interesses. Ora, o que se impunha era inflexibilidade na exigência do cumprimento das leis. Seja a punição do estacionamento irregular, do lixo deixado na rua junto ao ecoponto, ou do cócó do cão no passeio, seja a da condução em estado de embriaguez, do roubo, da corrupção, do abuso sexual ou do homicídio.
Se todos interiorizarem o respeito pela lei, se deixar de haver desculpas, deixa igualmente de se enfraquecer quem tem que impôr e aplicar coercivamente essas mesmas leis. Para que o bandido não tenha desculpa ou safa. Para que a segurança se viva na rua, em casa, na estrada, no trabalho.
Para que cada um assuma as consequências dos seus actos e se deixe de hipocrisias.

4 comentários:

A Tendinha disse...

Pois... por aqui também há o bom hábito de se reclamar da polícia que multa os veículos estacionados em linha amarela, sobretudo junto a um conhecido supermercado cá do burgo... não dá jeito! E quando eu por vezes digo "estão a fazer o trabalho deles, aqui é proibido estacionar; é chato mas é assim", sou olhada com ar de desdém...

marisa m disse...

o sentimento de que a lei é injusta quando se aplica ao próprio... é capaz de ser universal.
singular parece-me a capacidade de estabelecer uma relação entre a aplicação da lei AOS OUTROS e a eficácia dessa aplicação, bem patente na conhecida afirmação "a polícia havia de andar era a apanhar os gatunos EM VEZ de multar as pessoas"
a clivagem entre "os bandidos" e "as pessoas" exige uma dose de hipocrisia que de facto não está ao alcance de qualquer um...
tal como a galinha, o crime do vizinho é sempre maior, mais grave, e menos desculpável que o meu...
e, na cabeça de muita gente, os agentes da autoridade debatem-se REALMENTE com o dilema: "como é, hoje? vamos ligar o radar ou desmantelar uma rede criminosa...?"
(o que ainda me surpreende é que EU é que, perante esta gente, costumo passar por maluca... EU é que tenho fama de viver fora da realidade... )

Ariadne disse...

Pergunta de quem... digamos tentou, em vão, legitimar a questão do "lenocínio"...
E que vem a (des)propósito:
- As multas da Emel pagam-se?
LOOOOL
A esta hora um dos dois já revirou os olhos...
BEIJOS

Urso Polar disse...

Pagam-se.
A menos que se queira ficar em casa à espera que a EMEL venha cobrar.