26.1.13

À espera do fim

Com energia bateu os pés no passeio para afastar o frio que o invadia. Estava em pé havia quatro horas, e a temperatura atingira o ponto mais baixo, agora que o sol já rompia o negro do céu por detrás dos altos edifícios que os rodeavam.
Gente mais experiente trouxera bancos portáteis, cobertores, termos com bebidas quentes. Ele, estreante a estas horas, viera mesmo mal preparado. Tinha frio, fome, sede. Sentia as pernas inchadas por estar de pé tanto tempo seguido, sem sair do mesmo sítio. O desconforto era tanto que já nem sabia em que posição ficar. 
Conversas sussurradas eram mantidas, o vapor quente saindo para o ar gélido. A luz da rua era ténue, pelo que ninguém se ocupava a ler. Havia, pois, muito tempo para pensar na vida.
Os dias difíceis eram agora a regra. Desde o início da guerra tudo mudara. Primeiro o recrutamento, os dois rapazes a serem chamados, a mãe inconsolável, sem energia, sem iniciativa. Fechada em casa, sentada à janela, ao lado do telefone, olhava para o fundo da rua, à espera de ver chegar o carteiro com o telegrama ou ouvir o toque fatídico.
Depois o blackout. Com ele o racionamento. As filas. Contudo, agora já nem era razoável.
Acordar às três da manhã para ver se às oito agarrava um naco de carne. Já não se lembrava da última vez que comera carne.
E, entretanto, a espera. A mente a divagar. 
Sentia a loucura chegar. Sentia-o quando sonhava que seria tão bom se agora caísse ali um daqueles novos mísseis que se aproximavam em silêncio surpreendendo toda a gente. Seria tão bom, pôr fim a tudo.

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