7.1.13

Olhar

Quem estivesse atento perceberia que os olhos dela choravam. Sem que uma lágrima corresse. Sem que um soluço perturbasse a sua pose, vazia.
Encontrei-a no autocarro, onde a pressão da multidão desejosa de ser transportada nos juntou numa proximidade excessiva. Cruzámos  olhares, mas apenas encontrei um poço seco, morto, que focava para além de mim, como se eu fosse transparente e a sua mente estivesse ocupada por algo que acontecia por trás da minha nuca.
Foi preciso uma travagem brusca para alterar a fachada fria. Sem ter onde se agarrar, a sua mão tremeu no vazio para encontrar o meu peito como apoio. Assim que se firmou afastou-a como que largando um carvão incandescente.
Foi nesse momento, em que o embaraço acompanhou o sumido pedido de desculpa, que lhe vi a tristeza. Foi nesse momento que percebi que aquele olhar vazio chorava copiosamente, e que estar exposta ao público num autocarro cheio de gente que a comprimia, abafava, era um tormento sem igual.
Fiquei aliviado quando a vi sair e abalar em passo rápido, mãos enfiadas nos bolsos e cabelos lançados ao vento.

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