-Vais ver agora uma coisa que nunca ninguém viu. - disse o pai para o filho à mesa do almoço.
- O quê? - perguntou o petiz.
- Olha.
Com firmeza e experiência o pai começou a descascar a laranja numa contínua espiral sem partir a cobertura porosa. No ar pequenas gotas de sumo vaporizavam o cheiro que entrava pelas narinas e despertava os sentidos. A doçura fazia crescer água na boca e a criança aguardava expectante. Queria comer uns gomos do apetitoso fruto e queria ver aquilo que nunca alguém vira.
- O quê? - insistiu a criança.
- Não vês? Olha! - e exibiu o globo descascado.
- É só uma laranja descascada. Eu já vi isso.
- Mas nunca tinhas visto esta laranja descascada. Nem tu, nem ninguém.
- Ahh... - foi compreendendo.
O pai pegou então na peça única que era a casca, levantando-a e exibindo as suas curvas. Com delicadeza pousou-a na palma da mão esquerda, reconstituindo a forma esférica.
- Quantos pedaços?
- Ãhn?
- Vou partir a casca. Em quantos pedaços vai ficar?
- Três.
Levantando a mão direita o pai bateu três palmadas sobre a casca de laranja.
- Vamos ver.
Puxou o primeiro pedaço. Desviou um segundo e mostrou o terceiro e último.
- Três! Boa!
- Boa. Acertaste!
Com gosto viu o riso, a alegria estampada na cara do filho, e lembrou-se da sua própria alegria e surpresa quando, quarenta anos antes, o seu pai lhe revelara aquela maravilha.
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