18.2.13

O Sousa

- O Sousa!, alguém viu o Sousa?
Quatro pares de olhos se ergueram, mas ninguém esboçou uma resposta. O chefe, de fato escuro e gravata rosa, insistiu.
- Nenhum de vocês viu o Sousa?
- Eu não...
- Eu também não...
Os outros dois limitaram-se a abanar a cabeça.
- Onde é que esse filho-da-puta se enfiou? Se lhe ponho as mãos em cima...
Habituados a estas explosões, nenhum dos quatro motoristas levou a sério a vaga ameaça.
- Qual de vós está disponível?
- Eu estou à espera do Presidente. Ele disse que ia para casa mais cedo.
- O Sr. Director disse para não me comprometer com nada porque ainda tem que ir a um sítio... não sei onde.
- Eu fiquei de ir ao aeroporto buscar a esposa daquele Administrador... o coiso, pá, aquele careca.
Em seco, o quarto motorista procurou qualquer coisa, uma desculpa qualquer. Mas à medida que os segundos passavam em branco percebia que lhe saíra a rifa. Encolheu os ombros.
- Não tens nada? - interrogou o chefe.
- Não... - disse hesitante.
- Boa. Então vais tu em vez do Sousa. Quando vir esse gajo faço-lhe a folha!
- Vou onde?
- Anda lá dentro que eu te explico.

Baixando o tom de voz, o chefe abriu o livro.
- Vais com o Vice-Presidente. Leva-o onde ele te disser. Transporta quem ele disser. Não fazes perguntas, não fazes comentários, não vês nem ouves nada. Nunca falarás do que se passar a ninguém. Nem comigo... que não quero saber de nada.
O seu olhar interrogativo expressava a surpresa que sentia. Engoliu em seco, temendo o que lhe estava reservado. O chefe continuou.
- Não te preocupes, que não é nada de ilegal. O gajo gosta delas já crescidas, e não se mete com qualquer uma. Bebe demais, mas porta-se bem. Tem apenas cuidado porque às vezes há umas que querem aproveitar-se... não as deixes levar nada. E avisa lá em casa para não esperarem por ti. Hoje vais fazer serão até de madrugada.
- ...
- Quando o fores por a casa assegura-te de que ele entra bem e em segurança. A casa está vazia, pois a mulher e os putos foram para Madrid. E toma atenção aos fotógrafos. Se vires algum, o que é raro, evita-o.

Só então percebeu porque raio o Sousa, que sempre fora um baldas, nunca tivera problemas e o chefe, por mais que ladrasse, acabava por lhe tolerar tudo.

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