21.2.13

Sherlock

- Carla, viste o Sherlock? - perguntou Pedro enquanto fechava a porta das traseiras.
- Não. Há muito que não o vejo.
- Estará lá fora? - Pedro reabriu a porta e saiu olhando o vazio do quintal. O calor apertava e as cigarras ouviam-se no ar seco.
- A esta hora? Com este calor? Deve estar por aí, à procura do fresco.
- Ajuda-me a encontrá-lo. Não queria sair sem ter a certeza que está cá dentro. Sherlock! - chamou.
- Papinha! - aliciou a voz aguda de Carla. Nada.
Procuraram na casa de banho, onde por vezes se punha na banheira ou no lavatório hipnotizado por uma gota que caía de tempos em tempos. Nada.
Procuraram na sala, debaixo do sofá, onde costumava guardar os seus troféus. Nada.
Na cozinha, por cima dos armários. Nada.
No quarto, na cama. Nada. Debaixo da cama. Nada. No guarda-fatos. Nada. Nas gavetas da cómoda. Nada.
Voltaram à sala e viram nas estantes, sobre os livros ou por detrás deles. Nada.
No cesto da roupa suja. Nada.
No cesto da roupa lavada. Nada.
Durante toda a busca iam chamando por Sherlock, mas nem uma resposta.
- Vou abrir uma lata. Ele não resiste ao som.
- Não vale a pena. Ele está lá fora. De certeza. Vou procurá-lo.
- Não temos tempo, estamos atrasadíssimos. Vou abrir uma lata. - dito isto, avançou para a cozinha enquanto Pedro voltava ao corredor. Aí parou e chamou.
- Vem cá. Não vale a pena. Vem cá.
Carla retornou e viu a silhueta negra do gato, sentado na posição de bem-comportado, junto à porta da rua.
- De onde veio ele?
- Não faço ideia. Mas olha para o ar dele. Todo fofo e inocente mas  a rir por dentro, gozando-nos.
Correram para o gato que esboçou, sem a mínima convicção, uma fuga, deixando-se agarrar.
Apesar de atrasos, havia ainda tempo para uns mimos ao Sherlock.

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