20.1.05

Casino e Direitos de Autor

Os arquitectos Paula Santos, Miguel Guedes e Rui Ramos, que conceberam o Pavilhão do Futuro da Expo 98, hoje integrado no Parque das Nações, lograram obter decisão cautelar do Tribunal que obriga a Estoril-Sol a parar as obras de alterações em curso naquele edifício.
Como é sabido, a Estoril-Sol está a instalar naquele local o futuro Casino de Lisboa. Porém, iniciou obras profundas no edifício sem autorização dos arquitectos que o conceberam.
A questão é bastante interessante, quer socialmente, quer do ponto de vista do Direito. Está em causa a circunstância do fruto de um trabalho intelectual de natureza criativa, como seja um projecto de arquitectura, ser passível de conter direitos de autor, protegidos por lei. E, não é por estarem as obras autorizadas por licença camarária que tal questão fica prejudicada, pois que as Câmaras não têm qualquer poder de apreciação da matéria.
Mais interessante se torna a questão quando o projecto inicial, instalado na Expo 98 tinha carácter efémero e estaria sujeito a demolição no final da exposição. Porém, o edifício manteve-se ao longo dos anos, e hoje a Estoril-Sol, ao invés do demolir e construir de raiz um edifício para o Casino, decidiu "reconverter" o projecto. As obras em curso para a instalação do novo Casino de Lisboa vão alterar fachadas, que terão um revestimento e interior diferentes, embora mantenham a estrutura inicial do edifício.

É aqui que assenta a reclamação dos arquitectos e creio que com toda a razão. Como disseram em declarações ao Público, as obras vão corromper uma obra intelectual protegida, sem que os seus criadores tenham autorizado. Quando se contrata um arquitecto para conceber a nossa casa, e se lhe paga ao receber o projecto final, estamos a comprar o projecto, mas o arquitecto não abre mão dos seus direitos enquanto autor. E pode vir a reclamá-los se se aperceber da corrupção ou subtracção da sua criação.
Vir a Estoril-Sol alegar que a Parque Expo lhes garantiu que nenhuns direitos impendiam sobre tal terreno e edifício é inútil, pois falamos de direitos legalmente consagrados, para além das relações entre as partes do negócio da compra e venda.
A Estoril-Sol podia ter demolido o edifício e não o fez. Quis aproveitar a "obra". Então, das duas uma: ou envolvia os seus criadores na reconversão; ou deles obtia o consentimento para as alterações.

Esta é uma questão que vai correr os seus termos no Tribunal. A providência cautelar foi inicialmente decidida apenas ouvida a posição dos requerentes. Agora vai ser sujeita a contraditório e, depois, pode o Tribunal manter a primeira decisão, alterá-la ou mesmo revogá-la. Seguir-se-ão os termos da acção principal na qual ficarão definitivamente resolvidas as questões substanciais do litígio, concedendo-se, ou não, razão a uma das partes.
Tenho que dizer que tenho muita curiosidade em saber como vai ser decidida. Porém, o mais natural é que, antes de pronúncia final pelo Tribunal, as partes cheguem a acordo e ponham fim ao processo por transacção.
A ver vamos.

Sem comentários: