Não sei de onde veio. Só reparei nela quando se sentou ao meu lado. Tinha nas mãos o bilhete e o troco que se afadigava a guardar. Porém, e apesar do pouco movimento àquela hora, não a vira passar. Creio que era esse o seu problema. Ninguém a via passar.
Atentei nela com cuidado. Não era uma rapariga feia. Longe de ser deslumbrante, ou mesmo de ter uma qualquer característica chamativa, a verdade é que a suavidade do seu rosto e a luz do seu olhar transpiravam uma beleza diferente. Cuidada. Inteligente.
O guarda-roupa apagava-a. A normalidade descuidada tornava-a igual a toda a gente. A mochila devia ser um espelho do seu ser. Nada estava fora do lugar. Tudo simetricamente bem acondicionado, sem um desequilíbrio.
Assim que se sentou, depois de cuidadosamente recolher o bilhete e o dinheiro, fez aparecer um pequeno livro de bolso, preto, cartonado, onde começou a escrever. Mais uma pessoa tímida que se refugia num pedaço de papel onde congela o seu sofrimento. Para que não o esqueça. Para não perder a dor.
Passou a mão pelos compridos cabelos castanhos, rebeldes, dolorosos de pentear, e ergueu o queixo. Depositou o olhar em mim. Eu, que para aquele ser olhava fixamente, sentindo-me tão reflectido, não consegui esquivar-me. E durante segundos que pareceram horas estivemos olhos nos olhos.
Creio que ponderámos a hipótese de iniciar uma conversa. Mas como o outro não o fez, deixámos a oportunidade fugir.
Olhos nos olhos. Os dela não eram frios. Nem apaixonados. Eram olhos sofridos. Era o olhar de uma poetisa. Só podia ser. Uma mulher emotiva que sofre constantemente com os fracassos que não ousa conseguir. Alguém que desiste de começar, pois que o sonho, a expectativa, é sempre melhor que a realidade. Olhos nos olhos.
Aquele momento só findou quando duas raparigas entraram no átrio. O seu riso ouviu-se lá de longe. Nunca passariam despercebidas como aquela que se sentara à minha direita.
Pularam estridentemente até à minha companheira de banco que desviou a atenção para as recém-chegadas. Esboçou um sorriso que, sendo tão mentiroso, era tão natural. Um sorriso que ostentava de forma ligeira. O seu refúgio social.
Cumprimentaram-se. Gritaram. Guincharam. E saíram dali em direcção às bilheteiras. Três mochilas. Duas caóticas, outra uma perfeita obra de engenharia. Quando abandonaram o átrio em direcção à gare, ela olhou para trás. Mais uma hora que não demorou dois segundos. Olhos nos olhos.
Por detrás daquele sorriso havia dor.
Por detrás daquele sorriso ela chorava.
E mais ninguém o percebia.
Atentei nela com cuidado. Não era uma rapariga feia. Longe de ser deslumbrante, ou mesmo de ter uma qualquer característica chamativa, a verdade é que a suavidade do seu rosto e a luz do seu olhar transpiravam uma beleza diferente. Cuidada. Inteligente.
O guarda-roupa apagava-a. A normalidade descuidada tornava-a igual a toda a gente. A mochila devia ser um espelho do seu ser. Nada estava fora do lugar. Tudo simetricamente bem acondicionado, sem um desequilíbrio.
Assim que se sentou, depois de cuidadosamente recolher o bilhete e o dinheiro, fez aparecer um pequeno livro de bolso, preto, cartonado, onde começou a escrever. Mais uma pessoa tímida que se refugia num pedaço de papel onde congela o seu sofrimento. Para que não o esqueça. Para não perder a dor.
Passou a mão pelos compridos cabelos castanhos, rebeldes, dolorosos de pentear, e ergueu o queixo. Depositou o olhar em mim. Eu, que para aquele ser olhava fixamente, sentindo-me tão reflectido, não consegui esquivar-me. E durante segundos que pareceram horas estivemos olhos nos olhos.
Creio que ponderámos a hipótese de iniciar uma conversa. Mas como o outro não o fez, deixámos a oportunidade fugir.
Olhos nos olhos. Os dela não eram frios. Nem apaixonados. Eram olhos sofridos. Era o olhar de uma poetisa. Só podia ser. Uma mulher emotiva que sofre constantemente com os fracassos que não ousa conseguir. Alguém que desiste de começar, pois que o sonho, a expectativa, é sempre melhor que a realidade. Olhos nos olhos.
Aquele momento só findou quando duas raparigas entraram no átrio. O seu riso ouviu-se lá de longe. Nunca passariam despercebidas como aquela que se sentara à minha direita.
Pularam estridentemente até à minha companheira de banco que desviou a atenção para as recém-chegadas. Esboçou um sorriso que, sendo tão mentiroso, era tão natural. Um sorriso que ostentava de forma ligeira. O seu refúgio social.
Cumprimentaram-se. Gritaram. Guincharam. E saíram dali em direcção às bilheteiras. Três mochilas. Duas caóticas, outra uma perfeita obra de engenharia. Quando abandonaram o átrio em direcção à gare, ela olhou para trás. Mais uma hora que não demorou dois segundos. Olhos nos olhos.
Por detrás daquele sorriso havia dor.
Por detrás daquele sorriso ela chorava.
E mais ninguém o percebia.
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